Julgamento de Bolsonaro marca nova fase da democracia brasileira, analisa cientista político


Para o cientista político Bhreno Vieira, processo reforça credibilidade das instituições e influencia cenário interno e diplomacia

Esta captura de tela de um vídeo da AFPTV mostra o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro com sua tornozeleira eletrônica ao deixar o Congresso Nacional em Brasília, em 21 de julho de 2025. (Foto: José Osorio/AFPTV/AFP)

julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de integrantes do Núcleo 1 de seu governo pela tentativa de golpe de Estado, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), insere-se em um momento de reconfiguração política e diplomática do Brasil. A avaliação é do cientista político e professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Bhreno Vieira, para quem o processo representa “um marco inédito na história democrática brasileira” e se conecta diretamente ao contexto econômico, à soberania nacional e às relações internacionais.

O cientista político enfatiza ainda que esta é a primeira vez, desde a Constituição de 1988, que uma tentativa de golpe é julgada e pode resultar em responsabilização. “Ao contrário do passado, quando anistias enfraqueciam a democracia, agora as instituições estão aplicando sanções. Isso reforça a legitimidade do Judiciário, que foi alvo direto nos atos de 8 de janeiro”, afirma.

Para Vieira, o recado à comunidade internacional é claro: “As instituições brasileiras funcionam e tratam todos de forma igual, seja um ex-presidente ou um militar de alta patente.”

Ele conclui que a postura do Brasil no julgamento tende a aumentar a credibilidade do país junto a investidores e parceiros externos. “Estamos mostrando que não varremos para debaixo do tapete uma tentativa de golpe. Isso fortalece a democracia e projeta o Brasil como ator confiável no cenário global”, resume.

Pressões comerciais

Vieira lembra também que, desde julho, o país enfrenta pressões comerciais dos Estados Unidos, com a imposição de tarifas a produtos brasileiros, o que ele considera semelhante a sanções aplicadas a nações tidas como “inimigas” no passado.

“O Executivo vem conduzindo a narrativa, colocando a soberania como ponto central, e o julgamento de figuras-chave do bolsonarismo potencializa essa agenda”, avalia.

Ainda segundo o cientista político, a oposição perdeu o “timing” em meio ao fortalecimento da popularidade do governo em pautas econômicas e fiscais.

Impacto na oposição

Para Vieira, o processo no STF também tem consequências na dinâmica eleitoral. Ele observa que a ausência de Bolsonaro no jogo político abriria espaço para novas lideranças de centro-direita, como Ratinho Júnior e Eduardo Leite. “O Centrão não tem interesse em arrefecer o julgamento porque isso pode favorecer a emergência de nomes menos polarizadores que Lula”, afirma.

Vieira destaca que o julgamento aproximou Executivo, Legislativo e Judiciário em torno de uma agenda comum, diante das pressões externas e internas. Esse alinhamento foi favorecido, segundo ele, pelo efeito negativo das investidas de Eduardo Bolsonaro no exterior. “O tiro saiu pela culatra, prejudicando a base eleitoral fiel e afetando a imagem do bolsonarismo até entre seus aliados no Legislativo”, avalia.

Na visão do professor, a condução do caso coloca o Brasil no “olho do furacão” do debate da extrema-direita global. Ao julgar uma tentativa de golpe e responsabilizar um líder populista, o país envia uma mensagem de defesa da democracia, contrastando com a situação nos Estados Unidos.

“Isso incomoda Donald Trump (presidente dos EUA), que não quer ver um semelhante sofrer sanções que ele próprio não enfrentou”, acrescenta Vieira. Ao mesmo tempo, ressalta, o Brasil encontra apoio tácito de democracias europeias, que preservam a regra da não interferência.


 

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